Por Fabiana Esteves
A biblioteca da cidade onde trabalho vai fazer um um Clube de leitura com o livro "A hora da estrela", de Clarice Lispector. Tenho ainda receio de clubes, onde todos lêem o mesmo livro. Desatei a pensar nos prós e contras da leitura obrigatória. No quanto ela marcou a minha trajetória de leitora, tanto para o bem quanto para o mal. Enquanto criança recebia com alegria todas as leituras que me eram ofertadas. Estava descobrindo o mundo. Mas na calada da noite, sozinha, entregava-me ao prazer fácil das histórias em quadrinhos. Já adolescente, rejeitava toda e qualquer leitura obrigatória que a escola ousava me impor. Não gostava de dedos em riste. Muitos livros excelentes perdi a oportunidade de ler por este motivo. Fiz uma prova sobre uma obra do Érico Veríssimo que jamais li. Pedi que me contassem a história e gabaritei a avaliação. Depois li outros livros do mesmo autor e amei, mas aquele nunca mais. O mesmo aconteceu com "A Hora da Estrela", da Clarice Lispector. Uma das minhas autoras favoritas. No entanto, esse livro eu detesto. Fiquei me perguntando depois porque eu amava todos os livros de Clarice menos esse e a resposta veio veloz: ele foi leitura obrigatória na escola. Para mim A Hora da Estrela não passa de uma tentativa frustrada de Clarice de ser uma escritora normal. Graças a Deus ela não conseguiu. No entanto, toda regra tem sua exceção e essa máxima que eu mesma criei na adolescência, de me distanciar veemente de todos os livros de leitura obrigatória na escola foi quebrada quando eu me encontrei com Machado de Assis. Que delícia conversar com o autor enquanto leio a história! Li sem me cansar mil vezes a cena onde Bentinho penteia os cabelos de Capitu. Fiquei eternamente apaixonada por Machado. Tive a sorte de começar bem. O primeiro é sempre a porta de entrada para os próximos. Hoje vejo a Laís às voltas com suas leituras obrigatórias e gosto das escolhas. Vejo como ela se permite conhecer outros gêneros que talvez nunca se aventurasse espontaneamente. Em casa ela relaxa e lê seus romances clichês, seus best sellers... Não implico. Mas percebo que a leitura obrigatória ajuda a alargar os horizontes. Como autora, confesso que o momento mais feliz da minha carreira foi ter meu livro adotado por uma escola. Deitada na cama da contradição, escolho o caminho que me conquista primeiro…
Nas fotos acima, Laís e Ísis, filhas de Fabiana Esteves.
Autoria
Fabiana Esteves é Pedagoga formada pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNiRIO) e Especialista em Administração Escolar. Trabalhou como professora alfabetizadora na Prefeitura do Rio de Janeiro e no Estado do Rio com Educação de Jovens e Adultos. Trabalhou como assessora pedagógica e formadora nos cursos FAP (Formação em alfabetização Plena) e ALFALETRAR, ambos promovidos pela Secretaria de Educação do mesmo município. Também foi Orientadora de Estudos do Pacto pela Alfabetização na Idade Certa, programa de formação em parceria do município com o MEC. Em 2015 coordenou a Divisão de Leitura da SME de Duque de Caxias (RJ). Atualmente, é Orientadora Pedagógica da Prefeitura de Duque de Caxias, onde tem se dedicado à formação docente. Escritora e poeta, participou de concursos de poesia promovidos pelo SESC (1º lugar em 1995 e 3º lugar em 1999) e teve seus textos publicados em diversas antologias pela Editora Litteris. Escreve para os blogs “Mami em dose dupla” e “Proseteando”. Publicou os livros “In-verso”, "Pó de Saudade", "Maiúscula", "A Encantadora de Barcos" e "Coisas de Sentir, de Comer e de Vestir". É mãe das gêmeas Laís e Ísis.
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