Por Fabiana Esteves
Eu tenho mania de usar as orelhas dos livros como marcador. Confesso. Um pecado para os leitores inveterados, diriam alguns, e não diminuo o crime quando digo que sou uma. A minha maneira de amar os livros é marcar assim, deixando a orelha assim alargada, sinal de que escutou muito da história que mora dentro do livro. Pecado cruel deixar as páginas apertadas, grudadas umas nas outras enquanto eu não me digno a voltar a abri-lo. Quando eu leio, elas se libertam do abraço forçado.
Sendo poesia, eu faço pior: sou uma carrasca! Dobro a ponta da página! Nunca mais elas voltarão ao normal. Com o tempo, elas vão amarelando, amarronzando, cor de caramelo. A ponta me aponta onde devo ler de novo, mais uma vez, em voz alta, para outrem, tirar foto… a ponta marcada caramelizada de tempo me gruda o olho e a alma naquele poema que me laçou desde o primeiro momento. Como será o segundo? Não sei.
Minha filha herdou meus maus hábitos e pega a caneta que marca texto para enfeitar a frase que merecia ser de caminhão, do tipo que na gente segue e repete até decorar. O sumiço dos marcadores é um fenômeno crescente aqui em casa. A coleção de marcadores é tão grande que encontro os mesmos atrás do sofá, embaixo da cama, no chão do banheiro e sempre me pergunto porque as editoras não fazem como costumam fazer as Bíblias, que já trazem as fitas costuradas na lombada? E por que o bom leitor de Bíblia é aquele que a traz marcada, rabiscada, amassada e remexida, mas o bom leitor de livro é o que mantém o livro intacto, liso e limpo como veio da loja?
Rata de sebo que sempre fui, gosto de livros que carregam não somente a história que o autor escreveu, mas também sua própria história! Caço uma dedicatória, uma data, um comentário a lápis margeando a página… Terá sido um presente de aniversário? Terá sido adotado pela escola, discutido em sala de aula? Mas o nosso tempo é de sebos virtuais e o selo "bom estado" pode esconder tesouros que valem muito pouco…
Em tempos onde não se conserta quase nada, o livro usado, o livro antigo pode ser um objeto que só merece o lixo! Perdi a conta de quantos livros meu pai já pegou nas lixeiras por aí… Os meus tesouros não doarei ou deixarei de lado. Estão caramelizados, adoçados pelo tempo, as páginas caídas... Mario Quintana, Bandeira, Drummond… Não pense que não há as edições novas desses mesmos livros, ou esses mesmos poemas em antologias lançadas há menos tempo, o problema é que não acho a menor graça nelas!
E você, meu leitor amado, qual é o seu jeito de marcar as páginas e as histórias que você constrói com seus livros?
Na primeira imagem, um post do Instagram "Prosinhas Literárias", com um parágrafo de um livro destacado com marcador.
Na segunda imagem, Laís, filha de Fabiana Esteves.
Autoria
Fabiana Esteves é Pedagoga formada pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNiRIO) e Especialista em Administração Escolar. Trabalhou como professora alfabetizadora na Prefeitura do Rio de Janeiro e no Estado do Rio com Educação de Jovens e Adultos. Trabalhou como assessora pedagógica e formadora nos cursos FAP (Formação em alfabetização Plena) e ALFALETRAR, ambos promovidos pela Secretaria de Educação do mesmo município. Também foi Orientadora de Estudos do Pacto pela Alfabetização na Idade Certa, programa de formação em parceria do município com o MEC. Em 2015 coordenou a Divisão de Leitura da SME de Duque de Caxias (RJ). Atualmente, é Orientadora Pedagógica da Prefeitura de Duque de Caxias, onde tem se dedicado à formação docente. Escritora e poeta, participou de concursos de poesia promovidos pelo SESC (1º lugar em 1995 e 3º lugar em 1999) e teve seus textos publicados em diversas antologias pela Editora Litteris. Escreve para os blogs “Mami em dose dupla” e “Proseteando”. Publicou os livros “In-verso”, "Pó de Saudade", "Maiúscula", "A Encantadora de Barcos" e "Coisas de Sentir, de Comer e de Vestir". É mãe das gêmeas Laís e Ísis.
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