Por Andreia Marques
Os livros sempre fizeram parte da minha história. Logo na infância, descobri que livros são bem mais que objetos. Sua importância vai muito além de páginas, folhas, ilustrações e capas. São seres individuais, repletos de energia e personalidade. Assim, ler um livro e acomoda-lo na estante não é o mesmo que ter apreendido sua essência que, curiosamente, pode ser bem diferente daquela que o próprio autor pensou imprimir ao escrevê-lo.
Não poderia contar quantas obras li até aqui. Incluindo as que adquiri em livrarias ou sebos, as que consegui emprestadas, as doadas e as presenteadas, foram livros infantis, romances nacionais e internacionais, thrillers, HQs, biografias, fantasias, novelas e contos. Totalizam centenas ou, até mesmo, milhares. Ensinaram-me tanto! A ter sonhos, a ser mais analista, a desenvolver novos olhares, a escrever. Muito antes de ouvir falar em biblioterapia*, os livros eram, definitivamente, meus grandes gurus, professores, mestres, ou como desejar nomeá-los. Sempre foram uma fenda no universo psíquico pela qual eu poderia acessar todo o conhecimento que precisava e me evadir das realidades insustentáveis.
Com O Menino do Dedo Verde, de Maurice Druon, aprendi que todos nascem com um talento, algo que torna cada um de nós absolutamente diferente dos demais, e que, infelizmente, pode ser confundido com qualquer outra coisa ruim. Os que aceitam ser diferentes, assim como escreveu Artur da Távola, podem ser, e geralmente são, mal compreendidos.
Com Pollyanna, de Eleanor H. Porter, aprendi que tudo na vida pode ser considerado por mais de um ponto de vista e que, diante das dores da alma, a gente sempre escolhe, mesmo sem se dar conta, se empaca ou aprende, se murcha ou floresce.
Com A Marca de Uma Lágrima, de Pedro Bandeira, aprendi que não estava sozinha na adolescência, com minhas questões inerentes à idade. Que poderia chorar e que chorar era normal e saudável.
Com Menino de Asas, de Homero Homem, aprendi que algumas pessoas costumam ser cruéis com o que não conseguem entender. E que, mesmo assim, é preciso seguir com o que se é ou se deseja ser.
Com O Velho e o Mar, de Ernest Hemingway, aprendi a força que o espírito humano tem quando emprega todo seu ânimo e vontade na realização de uma aspiração. E que isso envolve dor, insegurança, medo, angústia e, principalmente, solidão. Significa entrar em contato com os próprios demônios internos em um trajeto onde nem todos serão capazes de enxergar seu sacrifício, mas admirarão sua coragem quando triunfar.
E, lendo o conto Venha Ver o Pôr do Sol, de Lygia Fagundes Telles, decidi que, em algum dia, estaria escrevendo tão bem quanto ela. Sigo tentando.
É claro que esses livros continuam me ensinando. Eles nunca acabam de dizer o que têm para dizer e ouvi-los é uma dádiva! Mas outros livros também me escolheram como aluna; A Metamorfose, Crime e Castigo, O Ponto Cego, O Alienista, 1984, Vidas Secas, Fausto, Dom Quixote... Obras-primas da literatura universal, legado que ficará para sempre disponível às futuras gerações, enquanto houver quem deseje “ouvir” seu sussurrar incessante de sabedoria.
*Biblioterapia: Emprego de leituras selecionadas como adjuvantes terapêuticos no tratamento de desordens nervosas. <https://www.dicio.com.br/biblioterapia>.
Autoria
Andreia Marques, fundadora da editora Panóplia, é filósofa, escritora, poetisa, mediadora de leitura, blogueira e designer. Publicou oito livros infantis e participou de diversas antologias. Nasceu no Rio de Janeiro, em 1978. Foi durante a infância que se encantou por literatura e fantasia, escrevendo sua primeira história aos dez anos, através de uma atividade escolar. Mais tarde, vindo a trabalhar como designer, encontrou no mundo das imagens uma outra forma de contar histórias e começou a produzir literatura infantil.
Site e blog: https://www.andreiamarques.com.br/
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