Por Fabiana Esteves
Quando eu era criança não havia pior data para se comemorar do que o Carnaval.
Para mim a festa era sinônimo de medo. Eu teria que sair com o compromisso (ou obrigação) de me divertir, o que nunca acontecia. Eu gostava da minha fantasia, mas os bate-bolas seriam presença certa. Eu morria (e ainda morro) de medo deles.
Halloween quase não se comemorava, e no máximo uma máscara de caveira aparecia. O medo infantil me acompanhava à noite, quando as luzes se apagavam. Monstros horripilantes, fantasmas medonhos e almas penadas se escondiam atrás das cortinas e brotavam das ondas que se formavam nos lençóis amassados.
Sombras se moviam com uma desenvoltura imensa nos meandros da minha imaginação. O mais triste era saber que não ia ter colo no meio da madrugada. Eu acendia a luz do meu quarto e lia gibis até dormir.
Hoje o Dia das Bruxas ganhou nova roupagem, incorporando a cultura mexicana trazida pelo cinema, a maquiagem é no mínimo profissional, e graças a Deus eu posso escolher não dar as caras em um evento deste.
No Carnaval posso estar onde não haverá nenhum mascarado. Sou contra? Não, a liberdade é preciosa. Mas não gosto. Quando eu era professora de inglês procurava que fosse o mais leve possível. Hoje sei que os monstros não brotam das dobras do lençol, mas as sombras ainda passeiam nas paredes, e faço questão de ignorar a nova temporada de Walking Dead. Não custo a dormir mais, o cansaço me assalta antes mesmo que eu possa imaginar a próxima ameaça.
Minhas filhas querem participar desse tipo de festa. Não proíbo, mas também não incentivo. Os nossos olhos merecem ver as lindezas que crescem na literatura, no cinema, na música e no teatro. Fomos feitos para encantar e sermos encantados. Já tem medo demais no mundo.
Crianças mais inteligentes têm mais medo? Pode ser. Os filmes de terror podem ser engraçados? Talvez. Mas não arrisco. O risco é grande. No máximo alguns livros de terror feitos para crianças (alguns são fofos, como os escritos pela Andréia Marques e o Felipe Campos). Quero que elas sejam felizes. Acho que é o desejo de quase toda mãe.
Laís e Ísis, filhas de Fabiana Esteves
E ser feliz para mim neste exato momento se resume a saber que o medo (ainda bem) não é hereditário.
Autoria
Fabiana Esteves é Pedagoga formada pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNiRIO) e Especialista em Administração Escolar. Trabalhou como professora alfabetizadora na Prefeitura do Rio de Janeiro e no Estado do Rio com Educação de Jovens e Adultos. Trabalhou como assessora pedagógica e formadora nos cursos FAP (Formação em alfabetização Plena) e ALFALETRAR, ambos promovidos pela Secretaria de Educação do mesmo município. Também foi Orientadora de Estudos do Pacto pela Alfabetização na Idade Certa, programa de formação em parceria do município com o MEC. Em 2015 coordenou a Divisão de Leitura da SME de Duque de Caxias (RJ). Atualmente, é Orientadora Pedagógica da Prefeitura de Duque de Caxias, onde tem se dedicado à formação docente. Escritora e poeta, participou de concursos de poesia promovidos pelo SESC (1º lugar em 1995 e 3º lugar em 1999) e teve seus textos publicados em diversas antologias pela Editora Litteris. Escreve para os blogs “Mami em dose dupla” e “Proseteando”. Publicou os livros “In-verso”, "Pó de Saudade", "Maiúscula" e "A Encantadora de Barcos". É mãe das gêmeas Laís e Ísis.
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